domingo, 28 de fevereiro de 2010

O conto dos palhaços:

E em suspiros de dor, fizeram-se vida dilatada,eram dois palhaços,secos,ávidos para embriagar-se nas horas orgânicas deste mundo.Aprendizes,não sabidos de si,buscavam nas paisagens dos sorrisos alheios os sentidos,os caminhos,o desatino para seus corações infelizes...Mas mesmo as suas pluralidades sobresaiam-se, como estrelas Ariostas e estranhas à espera de noites mais longas.
Naturais de São José do Egito,cidade famosa pela poesia no interior de Pernambuco,lá viviam os meninos a respirar rimas na entoada de versos,era literatura de vida,afinal toda vida é em sua essência literatura,no entanto é guardado esse segredo para que não se banalize o existir,para que não se subverta as sinas dos homens sãos,enfim...
E foi no suposto inverno,já que nesta cidade de clima semi-árido esqueceu-se a primavera,encontraram-se as criaturas;dois seres, no sereno de uma noite languida e fria.Queriam calor os rebentos para os seus sonhos quiméricos.
Queria o mais difícil deles fazer unas simplicidades,queria o mais fácil deles fazer unas dificuldades,foi assim,nestas buscas antagônicas eles uniram forças ou apenas idéias,para que pudessem ser melhores e piores,maiores e menores,insanos e rebeldes,transcendentes na verdade e principalmente aridez.
E enquanto bebem do crua realidade encontram-se na praça dos desencantos...
(Benjamin)- ....... Já o verme — este operário das ruínas —Que o sangue podre das carnificinas Come, e à vida em geral declara guerra, Anda a espreitar meus olhos para roê-los, E há-de deixar-me apenas os cabelos, Na frialdade inorgânica da terra!
(Augusto dos Anjos)
Vendo o mais fácil, o mais difícil fazendo simplicidades ele logo identificou-se.

(Antonio)- Filho do carbono e do amoníaco?Quem é o claustrico verme que anda a espreitar teus olhos?

Ainda com as vestes coloridas,do seu trabalho,Antonio observa aquele homem sentado em um banco a engolir estrelas,recitando versos.

(Benjamin)-Sou o filho dos palhaços esquecidos,dos que choram, dos que cantam e estremecem,dos quebrantos,das matinas sou o lobo,um palhaço que o mundo inteiro desconhece...sou Benjamin!Muito prazer!

(Antonio)-Logo vejo que a poesia em ti reside ,és poeta palhaço, mas sem as vestes..Já eu sou so palhaço e fiz-me assim para ganhar a vida,para torná-la suportável.

-Pois é,resta-me a cara pintada e uns versos de Augusto.Por que só riem de nós os outros?Por que não pode um palhaço chorar?Nem fazer chorar?Todos os dias no circo com a mesma missão,as mesmas piadas,os mesmo sorrisos,nenhuma sinestesia,nenhuma alma que compadeça aos meus anseios...mas não sou poeta não!Talvez não literalmente.
-Dois palhaços perdidos...(suspira Antonio)
-Esta noite parece infinita... ela é longa e perfeita para o espetáculo do qual deleita as almas esquecidas.... (murmura Benjamin).
Deitaram-se na grama da solitária praça, passaram a espreitar a lua,parecia que sol tinha esquecido de nascer,o tempo era inerme,indiferente,a lua não queria morrer ,os dois senhores aparentavam esquecimento,só existencialismo pairava naquele sereno.
-És o filho da felicidade *e almejas a dor? (perguntou Antonio) .
-Não almejo a dor,almejo o pensamento,questiono o entendimento e nessas bandas de Egito não encontro um só rebento que sinta as brisas deste alento.
-Mas hás de mudar isso se quiseres, só não faças de ti teu próprio mundo,não te isoles com o sepulcro das dores,aconteça no escurecer dos dias...
Depois de ouvido isso foi-se embora Benjamin, e quando saiu da praça fez-se dia de imediato,rasgou o céu o sol quando deu as caras.E depois de algumas horas pensando o tal alarde,percebeu a magia da praça e foi correndo ao encontro de Antonio.
Assim que chega a praça o sol dorme e tudo escuro enfim fica,Antonio o esperava.
-Chegaste meu caro, já o esperava!
-Trouxe idéias as melhores que existem,para mudar a nossa condição de simples descendentes de Adão.(Exclamava Benjamin)
-Sim?...contes-me também tenho algumas.
-Há de ser aqui onde as noites são mais longas e lua nunca morre.Já não trabalharás mais para ganhar a vida,mas ganharas vida a partir de hoje e em abundância...
E no empolgar do contar de seus pensamentos heis que abre-se a mala do tempo e pinta a tinta crua, suas faces,violentas pinceladas que marcaram perenemente suas vidas...Depois de pintados, entregam su’alma a Horus, o deus do poder e da proteção,Horus de imediato torna a noite infinita dando a eles o poder da criatividade também infinita e toda as possibilidades para fazer do tão sonhado espetáculo de Benjamin realidade.
Antonio assistia a tudo atônito e submisso,não questionava o amigo nem a si,aceitava apenas,nem sabia se seu sonho era realmente este,nem Benjamin o perguntava.
Então Benjamin começa a escrever os atos.Chamaria atenção das pessoa daquela pequena cidade,palhaços que não eram de palhaçadas,mas palhaços que catavam,filosofavam e faziam chorar,palhaços desumanos,palhaços sem alma...O amigo submetido começa a perceber que aquele não era o seu sonho,só que dá-se conta que não pode abandonar o companheiro,porque do contrário toda magia havia de acabar e o dia iria voltar com toda sua objetividade.
Benjamin empolgado começa a escrever os atos para o espetáculo.
-Tens antes de tudo a alma de poeta,podes não o ser propriamente,mas é como se escondesses nos teus olhos uns mistérios não óbvios,como se algo magnífico estivesse sempre por vir,porém temo em dizer-te algo mas ei-lo fazer...Eu não quero o infinito,não quero noites de orgiva,não quero isso.Quero o que acaba mesmo,quero voltar para casa, não quero a solidão junto as massas,perdoe-me estragar teu sonho.Ficarei contigo apenas esse ato e depois partirei!
Benjamin triste e ansioso pelo que lhe aconteceria,afinal Horus os castigaria severamente ,deu-lhes tudo pela união dos amigos e outrora estariam eles dispersos e distantes...
(...)
Muitos foram assistir ao espetáculo,nunca haviam visto noite tão longa e ato tão preciso,perfeito como nos sonhos do Benjamin.
E sem não mais tardar, heis que se dar o início do espetáculo incólume :
E heis que a praça faz-se palco,um palco de ilusões, no qual dois homens que se fizeram palhaços, debulhansse para mudar algo que os insatifaz ou para simplismente encontrar-se no meio de imensidões de quartos desencontrados...
-Digo-vos boa noite a todos os presentes,porque a noite há de ser mágica!
Falava Benjamin ao tom de ecoar pelos quatros possíveis cantos daquela praça.
-Vou lhes contar uma história,pois se não sabem vocês, palhaços também cotam histórias .Mesmo não sendo elas de pilhérias.
-“Foi nas bandas da imbiribeira,onde os beirais da sanidade passam longe,estava lá um jovem mancebo a contar estrelas,a sonhar com dias melhores e gente mais desprendida,quando avista uma jovem de vestes negras a chorar no banco de um jardim,o rapaz ao vislumbrar a imagem aproxima-se devagar sem que ela perceba,mas como que por impulso a jovem percebe a aproximação e sai a correr pela noite afora e desprotegida...
Na noite seguinte ele encontra mais uma vez a moça, tão alva e barroca como qualquer poesia de Gregório de matos e mais uma vez ela chorava,ela chorava pelos olhos e pela boca,murmurava baixinho palavras desapercebidas,e que ele tentava perscrutar cada uma delas.
Ele já ansioso por falar-lhe tropeça numa pedra e cai no colo da moça, ela se espanta e logo cai aos risos, respira para descansar os lábios risonhos e eles começam uma agradável e divertida conversa,minutos depois aparece o irmão do jovem que antes de qualquer coisa naquele lugar, percebe a beleza da mulher que estava a conversar com o mais velho filho de sua mãe.E dentro de si logo a primeira vista começa a pulsar um sentimento de arrebatamento e loucura.
Na manhã seguinte então ,os dois irmão juntos em sua caminhada matinal encontram a jovem alva e percebem que seus olhos ressacados de lágrimas sorriam incertezas.Os dois se apaixonavam pela criatura triste ,o problema é que não confessavam, guardavam em segredos seus desejos.E a moça como que para tentar afagar o seu peito doído e melancólico percebeu nos dois alegrias e encantos que a completavam,e para não permanecer inerte decidiu ela viver tudo e de todas as maneiras,afinal, não é pecado amar e assim depois de tanto minguar pelas aldeias do alheio decidiu abraçar o amor sem preconceitos, em toda sua essência.
Então todas as noites a criatura amava um dos jovens,era feliz e os fazia feliz,mas eles não sabiam dos acontecimentos, eles não sabiam que ela os amava mutuamente.
Era um por noite, e ela que era tão triste, tão só,encontra o amor, um farto amor,para deleitar-se todas as noites.
Foi um fardo,mas não um fardo pesado,era fresco,leve que perdurou por muitas noites,todas as noites do existir daqueles seres,perdurou em segredo até que seus dentes já lhes havia caído das faces,até o dia em que a terra lhes percorreu o corpo e as vestes...”
Amou aqueles homens aquela mulher,e todas as noites depois que partiam,dizia ela em gratidão aos Deuses:
- “Foi-se a solidão aos pares,
Hoje a solidão as massas.
Por onde a solidão andares?
Estarás sempre a praça!”
Quando então Benjamin termina de contar a história começa a chover,o céu comovido com os fatos ouvidos deixa cair lágrimas,para lavar dor e a banalidade daquelas pessoas,para fazer brotar naquelas vidas sonhos e desejos sepultados pelo cotidiano...
Depois de contado, Benjamin conversa em monologo a história.
Era um monologo desesperado, porque Antonio ameaça ir-se para sua vida passada deixando o amigo só,aos palcos e a solidão :
-Amou-se a dois!
-Seria pecado,pergunto a vocês?
-Seria!!?
-Só queria a jovem um pouco de alegria,para seus dias de solidão ,e dor, e melancolia...
-Quem nesse fim de mundo,há de julgar-lhe,afinal eram verdadeiros todos os seus pesares,sentires,arfares,todas as noites eram verdadeiras,assim como a lua e as estrelas ao seu lado.
-Ela só queria um pouco de acalanto, mas eles que foram egoístas demais de perceber-la nas suas necessidade,só a perceberam nas suas belezas.
-Ah...!!! humanidade limitada
-Mas é possível quebrar as amarras?
-É possível?!!...
Caiu aos prantos na emoção do seu enleio.E no desespero de ver Antonio partir.
Heis que o fim chega e Antonio vai-se embora sem despedir-se, esvai-se no silêncio das estrelas...logo após sua saída a magia degenera e Horus expulsa Benjamin do paraíso condenando-o a monotonia eterna nos palcos do circo,a Antonio restou-lhe a solidão das massas que lhe era tão temida e a cidade também pagou pelo egoísmo de ambos,choraria a partir dali o céu ,noites e dias incessantemente,ou até que Benjamin descobrisse que a magia das praças são postas sobres os beirais das calçadas dos quebrantos... E numa tarde nebulosa heis que algo acontece!
(...) Benjamin
-Achei o que porvir há de salvar!
Não ao sepulcro de meu lar!
Quebranto...

Amanda Braga

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